sábado, 1 de outubro de 2016

“Como você quer que eu te apresente?"

-"Como devo te apresentar?" - treinei mentalmente repetidas vezes o que devia falar. Respirei fundo.

Vi ele descendo do ônibus. O seu mesmo jeitinho, como da primeira vez. Desceu os degraus, virou, me olhou e abriu aquele sorriso maravilhosamente encantador. Os passos são unicamente dele. Se aproximou. Eu parado, chegou até mim. Um frio na barriga, como se fosse sempre a primeira vez.

Sem dizer uma única palavra, ele quebrou o gelo com aquele grande e gostoso abraço (nossa marca registrada). Aquele abraço que me faz esquecer tudo, que faz o coração bater mais forte e mais feliz. Aquele que faz as dores ficarem pra depois. Um caloroso abraço. Um abraço de amigo, de irmão, de anjos, de amantes, de pai e filho. Mas  é nossa marca, que nos fez nos despertou o desejo de querer encontrar-se  pela primeira vez. Ainda lembro como se fosse ontem o primeiro encontro que confirmou nossas existências: 

-“Você existe!”- existimos sim. Fomos um para o outro, e vivemos momentos maravilhosos, eu sei.

Um abraço que pareceu durar uma eternidade. Aconchego, carinho, tesão, amor, sossego e paz. Instantes maravilhosos. Fomos nos soltando aos poucos, abrindo nossos sorrisos. Ele me olhou com aquele olhar, chegou mais perto, se colocou na ponta dos pés - sou consideravelmente mais alto - tocou meu rosto com suas mãos, abaixou minha cabeça e me deu um caloroso beijo na testa. Aquele beijo de um pai em seu filho, o beijo da benção, do afago e do respeito. Olhei nos olhos dele de maneira profunda:

-“Eu quero mais."

Seguiu-se um beijo ardente. Daqueles iguais das novelas quando o casal se reencontra depois de muito tempo sem se ver. Um beijo tão profundo , carinhoso e delicioso. Os olhares ao redor viraram-se para nós. Afinal de contas um beijo entre dois homens não é coisa que se vê por aí, por mais normal que deveria ser. Nos desgrudamos, nos olhamos e rimos.

- "Não deveríamos ter feito  isso." - disse-me baixinho.
- "Por que não? Vem, vamos lá fora." 

Pegamos nossas malas e mochilas e, de mãos dadas, nos encaminhamos para a parte externa da rodoviária. Chegando lá fora, escolhemos um banco que nos ofereceu um pouco mais de privacidade e intimidade. Arrumamos as malas, nos sentamos olhando um para o outro. Ao nosso redor a paisagem exuberante da capital paranaense: Curitiba. Com suas árvores, flores e pássaros e o clima agradável com o sol do final do mês de janeiro.

- “Se o perto não fosse tão longe, o que é invisível seria visível”. - disse isso com um olhar intelectual somente para começar a conversar e quebrar o gelo.  Ainda bem que decidi tornar o invisível visível e o longe perto.


- "Fiquei tão feliz que você aceitou viajar comigo e visitar minha amiga em Paranaguá."
- "Não sei se foi uma decisão sensata" - disse Mark.
- "Fique sabendo que, independente de tudo, meu coração bateu bem mais feliz quando você disse: ‘sim, eu viajo com você Gabriel'!".
- "Eu sei, senti a sua emoção pelo celular" - disse Mark sorrindo.
- "Agora, temos que resolver um problema..."
- "Mais um?" - Mark ficou com uma expressão preocupada.
- "E esse será resolvido exclusivamente por você."
- "Como assim?"
- "Pense bem. Pense muito bem na resposta que você vai me dar."
- "Diga logo homem, não faça rodeios".
Percebi que Mark estava ansiosamente desconfortável.
- "Minha amiga e seus familiares vão querer que eu  apresente você a eles, e isso é óbvio. A questão é: como você quer que eu te apresente? Como meu amigo, meu amigo colorido, meu anjo, meu companheiro, meu namorado?  Repito e peço que pense bem: como você quer que eu te apresente?"

Mark me olhou nos olhos, esfregando as mãos compulsivamente uma na outra, demonstrando sinal de que sua ansiedade havia aumentado repentinamente.

- "Gabriel, meu bom anjo" - era assim, de meu anjo, que Mark carinhosamente me chamava - "Eu pensei muito nestas tantas horas de viagem até aqui, e, agora tenho certeza do que responder."
- "E?" - o seu desespero agora era meu.
- "Eu quero que você me apresente como seu..."

[..]


Ouvi um barulho bem ao longe que se aproximou rapidamente e fez com que eu não conseguisse ouvir a resposta de Mark.
- "Ei, acorda meu irmão, está na hora do café da tarde. Chega de dormir." - acordei num susto com a minha irmã gritando. Um sensação de não saber onde estava e uma leve dor não sei onde.

- "Ah, não! Poxa mana, justo agora?" - pensei alto demais, eu acho.
- "Hã?"
- "Nada não minha irmã."
- "Sei. Pelo sorriso que esta estampado no seu rosto imagino o motivo da sua felicidade. No minimo o senhor sonhou novamente com seu anjo. Acertei?"
- "Está tão nítido assim?"
- "Tem de responder essa maninho?"

Levantei, tomei um banho e fui pra varanda tomar café da tarde com minha irmã. Minha irmã foi primeira e eterna confidente. Sem dúvida aquela seria, mais uma tarde que tirei pra pensar em meu anjo. Até hoje ainda não descobri se ele é o motivo da minha felicidade ou da minha desgraça.

2 comentários:

  1. Mas Bratz, e se for aquele sorriso falso que extraímos de nosso intimo com intuito de enganar a todos e a nós mesmos?

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